A cafeína e o desempenho
físico
AMERICAN COLLEGE OF SPORT MEDICINE - CURRENT COMMENT
JULY - 1999
Tradução:
Michelle Reis de Sousa*
A cafeína talvez seja o estimulante mais usado no mundo. Ela é encontrada
em uma variedade de plantas, em fontes da dieta diária (incluindo café,
chá, chocolate, cacau e colas), e em medicamentos não prescritos.
A média de consumo de cafeína nos Estados Unidos da América é de
aproximadamente 2 xícaras de café por dia (200 mg); 10% da população
ingere mais de 1000 mg por dia. A cafeína é uma droga legal,
socialmente aceita, e consumida por quase todos os grupos na sociedade.
A cafeína é tida como um suplemento ergogênico nutricional,
mas ela não possui nenhum valor nutricional. A cafeína ingerida é rapidamente
absorvida pelo estômago e atinge seu ponto máximo no sangue entre
1 e 2 horas. A cafeína tem o potencial de afetar todos os sistemas do
corpo, já que é absorvida pela maioria dos tecidos. A cafeína
remanescente é decomposta no fígado e os subprodutos são
eliminados pela urina.
A
cafeína e o desempenho na prática de exercícios
de endurance
Estudos laboratoriais dos anos 70 sugeriam que a cafeína
melhorava o desempenho na prática de exercícios
de endurance, pois aumentava a liberação de adrenalina
no sangue, estimulando assim, a liberação de ácidos
graxos pelos tecidos de gordura e/ou pelos músculos
esqueléticos. Os músculos exercitados utilizam
essa gordura previamente na atividade física, reduzindo
a necessidade de usar o carboidrato (glicogênio) do músculo.
A "escassez" do glicogênio muscular acarreta
uma fatiga atrasada.
Em 1980, muitos estudos apontaram que a cafeína não altera o
metabolismo, e implicava que isso não tinha efeito ergogênico,
sem necessariamente medir o desempenho. Alguns relatos de fato examinaram a
cafeína e a performance durante exercícios de endurance, e, no
geral, não encontraram efeito ergogênico. No fim da década
de 80, especulou-se que a cafeína não altera o metabolismo durante
a prática de exercícios de endurance e pode não ser ergogênica.
Pesquisas recentes relataram que a ingestão de 3 a 9 miligramas de cafeína
por quilo, uma hora antes de se exercitar aumentou a performance de corrida
e ciclismo de endurance em laboratório. Para exemplificar, 3 mg por
quilo equivale a aproximadamente uma caneca ou dois copos de tamanho regular
de café coado; e 9 mg/kg = aproximadamente 3 canecas de 5-6 xícaras
de café de tamanho regular. Esses estudos avaliaram atletas bem treinados,
de elite ou sérios, e recreacionais. Estudos com indivíduos não
treinados não puderam ser desempenhados devido à incapacidade
deles de confiadamente exercitarem-se até a exaustão.
O mecanismo usado para explicar essa melhoria de endurance ainda não
está claro.O glicogênio do músculo é espalhado durante
exercícios submáximos seguidos por ingestão de cafeína
(5-9 mg/kg). É desconhecido se o glicogênio espalhado ocorre como
um resultado da capacidade da cafeína de aumentar a gordura disponível
para o uso do músculo esquelético. Além do mais, não
há evidências de um apoio de um componente metabólico por
estender o desempenho a uma baixa dose de cafeína (3mg/kg). Portanto,
parece que as alterações no metabolismo do músculo não
podem explicar completamente o efeito ergogênico da cafeína durante
exercícios de endurance.
A
cafeína e a performance dos exercícios de
curta duração.
As pesquisas sugerem que a ingestão de cafeína melhora o desempenho
durante um exercício de curta duração que dure aproximadamente
5 minutos em 90-100 por cento de oxigênio máximo de percepção
no laboratório. Essa intensidade do exercício exige o máximo
de provisão de energia de fontes aeróbicas (com oxigênio)
e anaeróbicas (sem oxigênio). É desconhecido se essa descoberta é aplicada
a situações de corrida. As causas da melhoria de desempenho pode
ser um efeito positivo direto da cafeína no músculo, provisão
de energia anaeróbica e contração ou um componente do
sistema nervoso central relacionado à sensação de esforço.
A ingestão de cafeína não parece melhorar o desempenho
em corridas, mas um laboratório extra e bem controlado é necessário
para confirmar essa conclusão. A corrida é definida como um exercício
que pode ser mantido de alguns segundos iniciais até 90 segundos, em
que a maioria da energia exigida é derivada de um metabolismo anaeróbico.
Dosagem
de Cafeína.
A cafeína é uma "substância controlada
ou restrita', como definida pelo Comitê Olímpico
Internacional (COI). Os atletas são permitidos até 12
ug de cafeína por mililitro de urina antes de ser considerada
ilegal. O limite aceito nos esportes sancionados pelo National
Collegiate Athletic Association (NCAA) nos Estados Unidos é de
15 ug/ml de urina. Esse alto limite na urina permite que os
atletas consumam quantidades normais de cafeína antes
da competição. Uma grande quantidade de cafeína
pode ser ingerida antes de se alcançar o limite "ilegal'.
Por exemplo, se uma pessoa de 70 quilos beber rapidamente cerca
de 3 a 4 canecas ou de 5 a 6 xícaras de tamanho regular
de café filtrado (~9 mg/kg bw) uma hora antes do exercício,
exercitado durante uma ou uma hora e meia, e somente depois
de dar uma amostra do nível de cafeína na urina,
alcançaria o limite (12 ug/ml). A probabilidade de se
alcançar o limite através da ingestão
normal de cafeína é baixa, com exceção
de volumes menores de café com altas doses concentradas
de cafeína. Portanto, um nível ilegal de cafeína
na urina talvez seja resultado de que o atleta tenha recorrido
a comprimidos ou supositórios de cafeína em uma
tentativa de melhorar o desempenho.
A dose adequada para potencializar a chance de que o desempenho
do exercício
aumente é de aproximadamente 3-6 mg /kg, onde efeitos colaterais são
minimizados e os níveis de urina são legais. Os efeitos da ingestão
de cafeína incluem ansiedade, nervosismo, dificuldade de concentração,
mal-estar gastrintestinal, insônia, irritabilidade, e , com altas doses,
o risco de arritmias cardíacas e leves alucinações. Enquanto
os efeitos colaterais associados com doses de até 9mg /kg não
parecem ser perigosos, eles podem ser desconcertantes se presentes anteriormente
em uma competição, e podem prejudicar a performance. A ingestão
de doses maiores de cafeína (10-15 mg/kg) não é recomendada
já que os efeitos colaterais são ainda piores. Deve-se também
ser notado que a maioria dos estudos usaram cafeína pura, em vez de
alguma bebida ou comida cafeinada. Portanto, não é certo que
consumir a "dose equivalente de cafeína" como café,
por exemplo, terá o mesmo resultado.
Efeitos Diuréticos da Cafeína. Café e /ou cafeína
são freqüentemente tidos como diuréticos, sugerindo que
a ingestão de grandes quantidades pudesse levar à uma condição
pobre de hidratação antes e durante o exercício. No entanto,
a literatura disponível não suporta efeitos diuréticos
imediatos como a temperatura central do corpo, perda de suor, volume do plasma
e o volume da urina não sofreram mudanças durante os exercícios
seguidos de ingestão de cafeína.
Considerações Éticas
É
fácil para atletas que praticam exercícios de
endurance melhorar sua performance "legalmente" com
a cafeína, já que efeitos ergogênicos têm
sido relatados com a quantia de 3mg /kg. Até mesmo a
ingestão de uma dose moderada de cafeína (5-6
mg/kg) é permitida. Sugeriu-se que a cafeína
deveria ser banida antes de competições de endurance,
exigindo que o atleta se abstivesse da cafeína aproximadamente
48-72 horas antes da competição. Essa limitação
asseguraria que nenhum atleta tivesse vantagem no dia da competição,
mas a cafeína durante os treinos não seria proibida.
No entanto, mesmo se a cafeína fosse banida no futuro,
que prática os atletas deveriam seguir no presente?
Para os atletas de elite é atualmente aceitável
e razoável ter sua dieta normal de café. No entanto,
se eles tomarem deliberadamente a cafeína pura para
obter vantagens na competição, está claramente
provada a falta de ética e isso é considerado
doping. Um assunto igualmente importante é o uso da
cafeína pelos adolescentes ou adultos. A expansão
do uso cafeína foi demonstrada em uma pesquisa recente
pelo Canadian Centre for Drug Free Sport (Centro Canadense
por Esportes Livres de Drogas). A pesquisa constatou que 27%
dos jovens canadenses (entre 11-18 anos), já usara alguma
substância contendo cafeína nos anos anteriores
com o único objetivo de aumentar o desempenho atlético.
A cafeína atua como uma droga de "escape" para
os jovens que usam substâncias perigosas? Para a média,
o adolescente ativo ou adulto que está exercendo com
o objetivo de divertimento e melhoria de performance, usar
a cafeína destrói esse propósito. O treinamento
e hábitos nutricionais adequados estão com alcance
mais sensíveis e produtivos.
Sumário
A ingestão de cafeína (3-9 mg/kg) antes de uma atividade física
aumenta o desempenho durante exercícios de endurance prolongados e exercícios
de pouca intensidade que dura aproximadamente cinco minutos no laboratório.
Esses resultados são geralmente relatados em uma elite bem treinada
ou atletas recreacionais, mas estudos mais específicos são necessários
para testar a potência ergogênica da cafeína no mundo dos
atletas. A cafeína não parece aumentar o desempenho durante uma
corrida que dure menos de 90 segundos, embora pesquisas nessa área estejam
faltando. O mecanismo para um endurance melhorado ainda não foi claramente
estabelecido. A escassez de glicogênio do músculo ocorre logo
no início da prática do exercício de endurance seguida
pela ingestão de cafeína, mas ainda não está claro
se isso é devido a mobilização e ao uso da gordura aumentada
pelo músculo. O efeito positivo da cafeína durante exercícios
que durem aproximadamente 5 minutos não está relacionado à falta
de glicogênio muscular. Os efeitos ergogênicos da cafeína
estão presentes com níveis de cafeína na urina que estão
bem abaixo do limite IOC permitido (12 ug / ml). Isso levanta questões éticas
a respeito do uso de cafeína pelos atletas. A prática deveria
ser perdoada, já que é legal, ou deveria ser desencorajada, já que
promove uma mentalidade "doping" e pode levar a abusos mais sérios?
Uma solução deveria ser adicionar a cafeína à lista
de substâncias banidas, portanto, é preciso que os atletas se
abstenham da cafeína 48-72 horas antes da competição e
desencorajar seu uso como um agente de doping para aumentar o desempenho na
média da população.
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* aluna do 3º ano do curso de Tradução e
Interpretação da UNISANTOS - Universidade Católica
de Santos.
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