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Qui, 8/1/09 11:03

DANÇA

DANÇA E CORPOREIDADE

   Pauta a história da Educação Brasileira, por uma negação do corpo através de adestramento e disciplinamento, fundamentada numa visão cartesiana mecanicista do conhecimento onde corpo/mente são vistas como duas entidades distintas. Essa visão cartesiana teve um efeito profundo sobre o pensamento ocidental, éramos pontos isolados dentro de nossos corpos e o trabalho mental era muito mais valorizado que o manual.
   No cartesianismo o homem existia porque pensava, hoje, sabemos que ele existe pelo simples ato de estar aqui.
Essa visão fragmentária de corpo/mente nos leva a aspectos negativos na educação e conseqüentemente na nossa sociedade. Os alunos, não podem ser considerados simplesmente como mente e seu corpo ser secundarizado em benefício dela, e é óbvio, que não devemos secundarizar a mente em benefício do corpo. Mente e corpo não podem ser instrumento a ser manejados. Precisamos fazer com que nossos alunos deixem de ser corpo-objeto e tornem-se corpo sujeito, um corpo vivido.
   A falta de uma reflexão mais profunda dos processos educacionais vigentes, a falta de paradigmas das ciências em geral e especialmente educacional, leva-nos a considerar o aluno como um espectador, um corpo-objeto, no processo de aprendizagem e com isto, uma falta de preocupação com sua auto-organização, com suas formas de vivência e interação com o meio, enfim, um ser UNO constituído de corpo, mente, emoções...
   Para rompermos definitivamente com o dualismo corpo/mente e "navegarmos" em busca desse ser UNO, necessitamos tornarmos "marinheiros" da corporeidade para encontrarmos o caminho da completa integração.
   Hoje se teoriza muito corporeidade, falar em corporeidade parece simples. O termo corporeidade entrou facilmente em nossa linguagem como se sua simbologia fosse de fácil interpretação e nos levasse a um único pensamento. No dicionário, corporeidade indica a essência ou a natureza dos corpos, um estado corporal. Os manuais nos fornecem o domínio científico e a etimologia nos diz que corporeidade é o derivado do corpo, é o organismo humano oposto à alma.    A corporeidade enfim, é relativo a tudo que preencha espaço e se movimente, e que ao mesmo tempo, situe o homem como um ser no mundo.
   Nunca ouvimos falar tanto em corpo como se fala hoje, novas ideologias de corpo, a sociedade investindo no corpo, a TV, a mídia, a igreja, a moda, enfim, uma infinidade de investidores buscando lucro através do corpo. Corporeidade entrou na moda, porém , a maioria das pessoas não têm compreensão do próprio corpo e muito menos do que a sociedade está fazendo com ele.
   Paulo Freire dizia que se corpo e espírito não andassem tão separados os homens seriam mais sensíveis, mais inteligentes.
   Podemos observar em nossa sociedade várias ações de domesticação do corpo. Corpos sendo manipulados, manejados em função de lucratividade. Quando observamos um desfile de modas por exemplo, será que há necessidade desses corpos estarem lá realmente? Um robô desempenharia muito bem esse papel. Fazem dos corpos na passarela um robô e todos batem palma. Um dia, estes estarão fazendo esse trabalho e os corpos serão facilmente dispensados.
   O próprio capitalismo é uma massificação de corpos, corpos dóceis desempenhando suas funções num ritmo padronizado e acentuado sem se darem conta que estão se deteriorando. São corpos úteis a determinadas funções no cumprimento de ordens e ainda muitos se acham importantes nas funções que ocupam. Corpos sem significado, rotulados para desempenhar determinadas funções e submetidos aos mecanismos das estruturas do poder.
   Não precisamos ir muito além, a escola. Esta, mostra um disciplinamento e um controle do corpo, das idéias, dos sentimentos, uma total anulação. Um disciplinamento que atua no corpo com intenção de transformá-lo num corpo dócil, num corpo preparado para se atingir melhores resultados, onde o aluno não precisa nem deve questionar, simplesmente executar e assimilar.
   Nesse contexto descrito acima, a disciplina é fundamental, porém, os professores se esquecem que um disciplinamento exagerado fabrica corpos submissos, corpos sem pensamento, alunos sem poder de decisão, sem autocontrole e sem autoconfiança.
   Um outro ponto para justificar essas considerações é a distribuição das carteiras em sala de aula, as atitudes dos alunos em relação as normas administrativas (metodologia do professor, regulamento escolar, os conteúdos e os livros didáticos), onde podemos observar claramente, que a escola tem como objetivo eliminar do corpo do aluno os movimentos involuntários, a espontaneidade e a criatividade, dando lugar somente as ações voluntárias e ao pensamento dirigido.
   Sem falarmos no processo de aprendizagem, este daria um livro só para ele. Na maioria das vezes uma aprendizagem sem corpo, onde os alunos devem entrar para classe somente com as mão e a cabeça. O corpo não há necessidade, pode deixar "na entrada da classe". Os conteúdos são dotados de assuntos diferentes daquele que o aluno vive, não tem um significado para ele. Não contribui em momento algum para sua formação, para sua realização pessoal e social.
   Como queremos que nosso aluno aprenda se ele não pode experimentar, vivenciar, perguntar, opinar, questionar, se nas aulas somente pode observar e repetir o que o professor apresentar. Muitas vezes, ou melhor, na maioria das vezes, ele nem sabe para que irá servir tudo aquilo que ele está "gravando", decorando.
Rubem Alves ilustra muito bem como a escola é artificial aos olhos de um observador preocupado com a liberdade e formação de corpos "não dóceis": "Escondidos em meio a vegetação da floresta, observávamos a anta que bebia à beira da lagoa. Suas costas estavam feridas, fundos cortes onde o sangue se via. O guia explicou: 'A anta é um animal apetitoso, presa fácil das onças. E sem defesas. Contra a onça ela só dispõe de uma arma: estabelece uma trilha pela floresta, e dela não se afasta. Este caminho que passa por baixo de um galho de árvore, rende às suas costas. Quando a onça ataca e crava os dentes e garras no seu lombo, ela sai em desabalada corrida por sua trilha. Seu corpo passa por baixo do galho. Mas não a onça que recebe uma paulada. E assim a anta consegue fugir!'
   Acho que a educação freqüentemente cria antas: pessoas que não se atrevem a sair das trilhas aprendidas, por medo da onça. De suas trilhas sabem tudo, os mínimos detalhes, especialistas. Mas o resto da floresta permanece desconhecido."
   E com isso, o corpo vai sendo um produto de nossa sociedade (dos homens da sociedade) que faz dele o que eles acham melhor para não comprometê-los nem colocá-los em risco.
   Mas falemos um pouco mais sobre corporeidade, talvez para podermos estar refletindo sobre o espaço que o corpo ocupa e as influências que ele pode promover quando não manipulado, quando considerado um ser-no-mundo dotado de plasticidade e com liberdade de expressão e ação.
   O corpo como sujeito no mundo é criativo e se humaniza a partir de sua existência. É a expressão da corporeidade, são as formas preenchendo espaço e determinando um significado.
São movimentos ondulantes e corpos cheios de significados, suas vivências corporais fazem a história e mudam o rumo da humanidade.
   Devemos aceitar o corpo não mais como a soma das partes, mas sim, pensar o corpo, como um sistema de interação, onde suas partes só possuem sentido quando relacionada com as demais. É uma totalidade integrada cujas ações existem sempre em função do conjunto.
   Podemos observar que cresce a cada dia estudos e pesquisas relacionados com consciência corporal, motricidade humana, corporeidade e cada vez mais, a negação do corpo está ficando nas páginas do passado.
   Está se acentuando a necessidade de observação do corpo, uma nova maneira de vê-lo, porém essa nova abordagem do corpo requer uma amplitude de conhecimentos para poder estarmos entendendo a complexidade humana e o significado da palavra corpo num sentido mais amplo.
   O corpo se define simplesmente por ser, por ocupar um espaço, faz parte do mundo, se relaciona com ele, interage com as coisas do mundo e também se relaciona com outros corpos.
   Somos corpos fazedores e transformadores de um mundo, corpos vivos, num tempo e num espaço experimentando todas as possibilidades emergentes e que nos são de direito.
   Diante destes fatos, começo a pensar que se faz necessárias modificações no processo educacional. Urge uma renovação pedagógica que privilegie a inserção corporal, uma educação que assuma a corporeidade humana e formule novos paradigmas abandonando o mecanicismo tradicional, uma educação que se aventure a percorrer por caminhos desconhecidos, que busque novas trilhas, novas descobertas e que não tenha medo de estar tornando vivos os seus aprendentes.
   Devemos proporcionar para nossos alunos uma educação humanizante, uma educação onde nossos alunos possam ser psicológicos, biológicos, fisiológicos, cinesiológicos e antropológicos. Uma educação que transforme seus conhecimentos e que contribua para uma integração qualitativa ao meio social.
   Precisamos também, estarmos atentos a uma melhoria nos processos educacionais, para que possamos fazer emergir a construção de novos conceitos, novas vivências, e a partir daí, estarmos contribuindo para a descoberta de novas possibilidades.
   Não temos como fugir de uma educação corporal, uma educação que considere o corpo como uma ligação homem-mundo, ela está presente na cultura, nas tradições, na natureza, no cosmos.
   Nossos alunos precisam de uma educação que comprove nossa existência e importância no mundo, que entenda que é preciso existirmos para que o mundo possa existir também. Uma educação que considere importante que nossos corpos se movimentem, se transformem, para que possamos transformar as coisas do mundo e ao mesmo tempo estar organizando e desorganizando o nosso auto fazer-se.
   A educação que buscamos deve possibilitar autoconhecimento, compreensão de si mesmo e de seu mundo, prazerosidade, contato com o lúdico e desenvolvimento de uma consciência crítica, favorecendo e incentivando o aluno a manifestar suas idéias através de um agir pedagógico coerente, e a partir daí, o aluno possa expressar sua corporeidade e sua capacidade de adaptação, favorecendo ao mesmo, acoplamentos estruturais nessa relação bio-psico-energética.
   Quando pensamos no aluno-corpo, pensamos em seres que brincam, correm, saltam, dançam, escrevem, choram, riem e tantas outras formas de manifestação que um corpo pode ter.
   Esse aluno-corpo é movimento em tudo o que faz, é um significante expressando sentimento. Seu corpo é ativo no espaço que ocupa, se comunica com os corpos ao seu redor e interage com eles.
   Um corpo em busca de novas possibilidades, novos caminhos, um corpo que necessita estar, ser, sentir e ser sentido.
   Devemos nos engajar numa Pedagogia pós-moderna, uma Pedagogia que esteja associada às novas visões de uma educação através da corporeidade de seus aprendentes. Uma Pedagogia que não se assuste ao deparar-se com conceitos básicos emergentes, uma Pedagogia que não se assuste a trilhar por novos caminhos envolvidos com os processos de ensino, capazes de uma nova configuração do agir pedagógico.
   Uma educação com a tarefa de propiciar condições para a interpenetração dos nexos corporais, das linguagens e dos comportamentos na vida concreta das pessoas. Uma educação voltada para uma dinâmica prazerosa, possibilitando o vivenciar de uma ecologia cognitiva, carregada de significado, onde a plasticidade do corpo possa se manifestar e romper de vez com o dualismo corpo/mente.


Profª Ms. Érica Verderi - FEFISO/ACM
verderi@cy.com.br

 

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